Coopetição em saúde

Coopetição, um conceito de colaboração em competição, é a palavra-chave que pode ajudar a dar respostas a quatro desafios globais que se colocam ao sistema de saúde português.

No setor da saúde, o desafio do pragmatismo permite que as políticas da saúde não sejam irreversivelmente afetadas por aspetos de natureza ideológica. Se as propostas políticas se situam exclusivamente no plano da disputa partidária e dos ciclos eleitorais ou orçamentais, as respostas ficam definitivamente comprometidas ou adiadas.

Um exemplo, a prática privada liberal, convencionada com o SNS e financiada com base em resultados poderia ser uma resposta adequada às listas de espera intermináveis no SNS para algumas áreas de especialidade médica, tais como psiquiatria e psicologia, otorrinolaringologia, dermatologia, oftalmologia e medicina dentária.

Verifica-se, hoje em dia, que as mais prevalentes doenças crónicas, tais como cérebro-cardiovasculares, cancro, doenças respiratórias, diabetes, doenças mentais e da cavidade oral, partilham entre si vários fatores de risco, como o uso de tabaco, abuso de álcool, sedentarismo e nutrição desadequada. Os mais afetados são os menos favorecidos e as populações socialmente marginalizadas.

Estes fatores de risco implicam respostas a este desafio da transversalidade no sistema de saúde, composto pelo nosso SNS, privados e setor social.

O desafio da responsabilização que enfrentam as sociedades europeias no acesso à saúde não é apenas de gestão e financiamento, mas também do foro cívico e educacional. É preciso desenvolver uma capacidade pedagógica na população, no sentido da cultura dos direitos e deveres de todos e de promoção de literacia e autocuidados em saúde.

O desafio da sustentabilidade visa assegurar o direito de proteção na saúde para todos. Implica a alteração de vários paradigmas, tais como consciencializar a população que os cuidados de saúde não são gratuitos.

Nos dias de hoje, a perceção desinformada da gratuitidade é perversa em termos de comportamento sociológico. Ainda que indiretamente, por via fiscal e pagamentos diretos, os serviços de saúde são pagos por todos nós ou pelo menos pela larga maioria dos cidadãos.

Precisamos de mobilizar a inteligência coletiva no nosso sistema nacional de saúde e da sociedade no seu todo para implementar nesta próxima legislatura uma cultura organizacional e regulatória com mais colaboração no setor privado, mais competição dentro do setor público e mais coopetição entre público, privado e social.

Artigo publicado originalmente a 27 de março de 2024 na edição impressa do Jornal de Notícias (pdf).

Também disponível na edição online do Jornal de Notícias (site).

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